terça-feira, 26 de maio de 2009

Correntes


Abri o emeio e ela estava lá, mais uma vez: "Até quando vai me ignorar. Não rompa essa oração genial, criada pelos mais remotos clãs das Highlanders escocesas. Isso não é corrente, garanto. Uma senhora, no Canadá, rompeu-a e um canguru sambou no teto da Ferrari dela. Não conseguiu convencer o seguro a indenizá-la. Um norueguês comeu bacalhau estragado depois que rompeu a corrente, quero dizer oração. Você verá que coisas maravilhosas, fantásticas, acontecerão em sua vida, basta enviar para doze amigos. Não, não é possível que você não tenha doze amigos".
Ah, quié, claro que tenho doze amigos. Tenho até mais de doze, acho que tenho uns treze, quatorze amigos. Mas já ouvi todos dizerem que detestam essas correntes, melhor, "orações". Eles nem abrem. Mas, e se eu enviar? Talvez abram, afinal, amigo é até para isso. Selecionei os doze amigos e enviei a mensagem, muito bonita por sinal. Bom, a minha parte eu fiz, pensei, não serei eu a quebrar a "oração". Desliguei o computador e saí para almoçar. No restaurante recebi a primeira das "boas" notícias: "O que houve? - perguntou Rony. Todo mundo já almoçou, inclusive a Luê. Aqui, estava linda". Tudo bem, almoço sozinho, pensei. Sentei e pedi o meu prato. Aliás, só como um tipo de comida: peixe. "Acabou", disse o garçom, secamente. Comprei duas barras de cereais na esquina e voltei para o serviço. Na minha mesa um bilhete em letras garrafais: "Compareça ao departamento pessoal". Esvaziei logo as gavetas e fui, esperando pelo pior. "Aqui, seu maluco, irresponsável, quantas vezes eu te falei para não me enviar essas porcarias de correntinhas. E parece que você enviou para todo o RH e pro presidente. Sabe o que vou fazer contigo? A nossa filial na África está precisando de um gerente. Você vai pra lá" .
Bom, pelo menos não perdi o emprego e ainda poderei ver a Copa do Mundo, se não quebrar nenhuma corrente até lá.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Departamento Jurídico


Ainda procurando o seu processo, seu Eduardo?
Ainda, mas não sou o seu Eduardo, sou o filho dele, é que o processo está tão lento, mas tão lento, que o meu pai morreu e agora estou aqui, tentando resolver, pegar as coisas dele, pra guardar como recordação, tão somente.
Que absurdo, pelo amor de Deus! Me dá o número desse processo, vou resolver isso para você. Posso chamá-lo de você?
Lógico. A propósito, quem atendia ao meu pai era o seu.
Então faz tempo mesmo, o meu também morreu.
Aqui o número.
Pode me chamar de Pedro, o mesmo nome do meu pai, ou de Júnior, como todos me chamam na repartição. Epa!
O que foi, Júnior?
Tá faltando algarismos.
É que o processo é tão velho, que já ganhou mais algarismos. Não tem lugar nem para uma vírgula, mas o que eu gostaria mesmo é que não tivesse mais espaços para despachos.
O sujeito, o tal do Júnior, desapareceu atrás de uma porta, voltou, muito tempo depois, com um calhamaço nas mãos.
Tá aqui, não te falei que resolvia? Até despachei. Pedi pelo prosseguimento.
Tô vendo, a mesma coisa que os outros fizeram, e que farão todos os demais por onde esse maldito processo passar.
Então vou pedir pelo não prosseguimento.
Que tal pedir pelo indeferimento, ou pelo deferimento, ou pelo arquivamento. Isso é só um pedido de aposentadoria. Quando vocês pediram pelo prosseguimento, o meu pai prosseguiu trabalhando, mas ele queria somente o deferimento, pois já havia mais que completado o tempo dele.
Não fique nervoso, isso aqui vai melhorar, vamos informatizar tudo. O secretário já enviou o processo para o jurídico.
Como veio o despacho?
Pelo prosseguimento.

sábado, 16 de maio de 2009

Tantos



Estou um tanto quanto
jogado a um canto
enquanto o pranto
me serve de acalanto
entretanto, entre tantos cantos
levanto o manto, quebro quebrantos
desencantos, agiganto, adianto
suplanto, imanto, planto,
transplanto, replanto,
me espanto comquanto
.


Fingidor


Você se foi
o sono veio
e me pegou
não sei se durmo agora
ou aguardo a sua volta
trará novidades
dirá coisas belas
me fará ciúmes
e eu nem aí
pois na verdade
sei fingir
isso faz parte
da minha arte
um bom fingidor
esconde a dor
a transforma em riso
isso é amor
é amor
é amor.

sábado, 9 de maio de 2009




Está errada a definição para ejaculação precoce. É ejaculação involuntária. Precoce é a ejaculação que acontece entre os dez e dezessete anos.



O crime está muito organizado, toda essa gente está de parabéns: Executivo, Legislaqtivo e Judiciário.


Remédio controlado. Isso não é redundância? Pois deveria ser, só não é no Brasil, onde se compra até tarja preta sem receita.


Responda à sua mulher no gerúndio. Ao patrão, no pretérito perfeito. Aos amigos, no futuro do presente.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

O escritor



Cinco minutos foi o tempo que me dei para escrever uma crônica, ou um conto.
Escrita a primeira linha, achei que as demais viriam com certa facilidade, ledo engano. Foi uma tortura só. Passaram-se os cinco minutos, dez minutos, uma hora, um dia e nada.
Eu havia voltado do médico, que me aconselhou a escrever, disse que eu posso me inspirar na minha história pessoal. “Sério”, continuou ele, “gostei desse poema”. Mas esse poema não é meu, é do Fernando Pessoa. “Mostre-me um dos seus”, pediu-me. Doutor, eu não escrevo poemas, melhor, não escrevo nada, vou começar a escrever agora, por sua única e exclusivíssima recomendação.
Foi assim. Já estou há dois dias diante do computador, nada além da primeira e solitária linha. Resolvo ligar para o meu médico, dizer pra ele que o tratamento está equivocado, que não consigo escrever, que isso está me deixando com os nervos à flor da pele, que isso está me deixando sem pele. É que quando fico nervoso começo a me escarificar. Os remédios não funcionam mais, não durmo há dois dias nessa tentativa frustrada. Já quebrei um notebook e uma máquina de escrever. Atirei o primeiro na parede; a máquina, em cima do meu cachorro, que estava me atrapalhando a... escrever, mas acho que ele estava mesmo era com fome. O coitadinho fugiu de casa e ainda não voltou. O próximo computador, vou jogar em cima do meu médico, do doutor Ubirajara Santiago Pontes de Miranda, psiquiatra e psicanalista.
Ligo pra ele. Como assim doutor, não foi o senhor que me atendeu? O senhor está num congresso em Utah, nos Estados Unidos da América? Então, quem foi que me atendeu e me receitou essa idiotice de escritor, hein!? O Maníaco das mil faces!? Filho da puta, eu nem desconfiei. E como um hospital dá alta para um sujeito louco de pedra como ele? Não deram alta!? Ele fugiu e atendeu a todos os pacientes do senhor!? O que faço agora, o que o doutor me receita? Preciso dormir, fazer as pazes com o meu cãozinho. Música? Mas eu não sei tocar nada, a não ser computador na parede!
Sempre sigo a recomendação médica. O doutor Ubirajara Santiago Pontes de Miranda voltou do congresso e disse que estou mandando muito bem na tuba, até pediu pra não levar mais nas próximas consultas. Não entendi o porquê, se ele mesmo disse que estou indo bem.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Haicais




Pomar multicor
a fruta mais saborosa
é a laranja.

No horizonte
um relâmpago brilha
clareia céu e mar.

terça-feira, 5 de maio de 2009

Esquecidos




Entraram no motel pela manhã, quando a maioria está saindo. Decidiram pedir a mesma suíte da última vez. E viram que ela estava diferente, bem melhor, mais moderna, cheia de novidades. Ponto positivo. Havia desde banheira de hidromassagem até aparelhos de ginástica. Até desconfiaram se era realmente uma suíte de motel ou uma academia de ginástica. Não importava, estavam ali para comemorar alguma coisa. Aniversário de casamanto? Aniversário da mulher? O primeiro encontro? Ambos riram, pois esqueceram o que foram fazer no motel. Até lembraram, mas não faziam há tanto tempo, que nem se importaram. Ela ficou na banheira, dizia que era bom pra coluna; e ele, aos noventa e dois anos de idade, tentava levantar um alteres.

sábado, 2 de maio de 2009

Arraial do Cabo


Tens as praias mais belas
do litoral
Prainha, Praia Grande, dos Anjos
do Pontal.
Praia do Forno, Prainhas
e a Brava tão pequenina
mas de beleza divinal
tens ainda a mais perfeita
a Praia da Ilha
que todas as demais
humilha

Praias de águas quentes
mornas, cristalina.
fundo transparente,
que banham não só o corpo e
referescam nossa mente.
Que privilégio, Arraial
seu clima, embora tropical.
tem o fenômeno da ressurgência
corrente polar
que vem enriquecer
a fauna marinha do lugar.

Para Luiza, minha bailarina


Poemas de amor?
Vê se estou na esquina
Ah, faça-me o favor
Procure outro poeta, menina.

Não escrevo para aplacar dor
Minha escrita sempre desafina
Não sou médico nem doutor
E de amor não entendo patavina.

A minha raiva não é uterina
Fui criado com amor
Mas certo dia troquei o leite por nitroglicerina.

Vou mais longe, mina
Se me pegar fazendo versos de amor
Será para a minha bailarina.